terça-feira, 13 de setembro de 2011

[espaço do leitor] Apodi do meu tempo – dá uma saudade...


... Das festas paroquiais, com as humildes barraquinhas de vendas instaladas no canteiro da Rua São João Batista, no trecho compreendido entre a frente da casa de dona Amélia de Zé de Cândido até a frente da Agência dos Correios e telégrafos, com apetitosos bolos pé-de-moleque, de batata-doce, bolo de leite, e das garrafinhas de refrigerantes cheias com Ki-suco - naquela época a cidade não contava com energia elétrica ininterrupta (oriunda de Paulo Afonso, na Bahia), sem contar que rara era a casa em Apodi que tinha uma geladeira à querosene, fato associado à falta de condição para manter refrigerantes gelados à venda. As barraquinhas eram iluminadas à lamparinas, dado a pouca luminosidade das lâmpadas dos postes da iluminação pública;

... Das mentiras contadas por sêo Emídio Dias, especialmente a que ele dava mais destaque, que era a do dia em que o famoso cangaceiro Lampião passou em sua casa, em Umarizal, e pediu água para beber, e que ele (Sêo Emídio) deu um copo grande, cheio, ficando com outro copo de zinco na outra mão para reabastecer. Ao ver que o homem jogou a metade da água fora, Sêo Emídio jogou a água do outro copo na "cara" do moreno que pedira água, dizendo-lhe: "Você lá queria água!", tendo o dito pedinte se retirado sem dizer nada. Ao perguntarmos ao sêo Emídio se ele sabia que aquele homem era o valente Lampião, ele respondia prontamente: Não sabia não! - mas se soubesse jogaria a água na cara, do mesmo jeito!.

... Dos banhos matinais no "poço dos homens" (na lagoa) ainda ao alvorecer do dia, ocasião em que era costume os homens e mulheres banharem-se totalmente despidos, sendo certo que uma cerca com varas trançadas dividia o lado dos homens do lado das mulheres, que era chamado de "Poço da Matuta". Saliente-se que existia um vasto matagal (Matapasto) que dava uma certa proteção a olhares indiscretos;

... Das histórias de "trancoso" e de "Camonge" (É assim que ainda hoje os meninos ouvem dos mais velhos, contando casos que tem CAMÕES como protagonista) contadas na calçada de Sêo Lulú Curinga, a mais frequentada do "QUADRO DA RUA", principalmente em noites com lua, derramando sua luminosidade após o apagar da iluminação pública, geralmente quando faltavam 15 minutos para as dez horas;
... Dos namoricos de Chico de Abília com Rita de Zé de Cândido, que ficava na parte de dentro, na janela do oitão da casa senhorial, sendo certo que o Chico ficava sempre com o pau na mão (cassetete) e ia de vez em quando olhar o Jardim (Praça Getúlio Vargas), onde ele era o vigia encarregado pelo Prefeito, para evitar depredação nos lustres dos belos postes de cimento;

... Das travessias que, quando menino, fazia - do "Poço dos homens" até o horto florestal, para roubar e comer batatas-doces cruas, sempre em companhia de Merson (Emerson) e Elano de Aldecí de Sêo Emídio, ocasião em que deixava o calção na margem e fazia a travessia completamente "pelado";

... Dos palavrões ditos por EDITE NORONHA, que ficava profundamente irritada quando a chamavam de EDITE PÊI-PÔU, ou quando perguntavam: "EDITE, CADÊ ABEL? No que podia esperar a resposta da sua língua afiada: "Tá no rabo da sua mãe, seu Filho duma puta!";

... Dos pastorís no patamar (Adro) da Igreja-Matriz, com desfiles das bailarinas dos cordões encarnado e azul. O cordão que arrecadasse mais dinheiro seria o vencedor. O dinheiro era revertido para as despesas da Paróquia;

... Dos ruidosos ventos expelidos pelo Rodolfo Gama e seus filhos, seguidos de grandes "gaitadas" dos mesmos, que residiam vizinho à minha residência, separados apenas por uma "parede-e-meia", o que dava para ouvirmos qualquer conversação, ficando os segredos restritos aos sussurros; Desnecessário dizer que tal mania do Rodolfo e sua prole abria precedentes para que, também, fizéssemos a  mesma estripulia, oriunda do processo digestivo;

... Dos jogos futebolísticos que assistí, muitas vezes, escanchado em um dos galhos da famosa "Timbaúba do Campo", que ficava em frente ao estádio Antonio Lopes Filho, na rua Adrião Bezerra;

... Dos boêmios que frequentavam o famoso "Bar Satélite", e que entravam sóbrios e saíam fazendo a coreografia do bêbado e do equilibrista:

... Dos circos que chegavam à cidade, com seus "PALHAÇOS COM PERNAS-DE-PAUS", eficazes responsáveis pela divulgação da presença do circo na cidade - o atual marketing. Sempre integrei a "leva" de meninos que acompanhava o palhaço para responder as perguntas do mesmo:

- O QUE É QUE A VELHA TEM?

- CARRAPATO NO XENDEM! Respondia a meninada, pronta para responder a pergunta seguinte:

- VOU AQUÍ VOU ACOLÁ!

- VOU COMER MARACUJÁ! gritava a gurizada, para no mesmo instante remexerem os quadrís, imitando o palhaço, que dizia: "REMEXE A CANJICA!. Os meninos que integravam a comitiva do palhaço ganhavam a entrada gratuita, no que eram carimbados no braço - espécie de passaporte, para quando chegasse a noite apresentar o braço carimbado ao porteiro do circo,
que franqueava a entrada gratuita;

... Do primeiro filme que assistí, gratuito, exibido na parte de trás da Igreja-Matriz, cuja parede serviu de telão, cortesia do Sr. Gabriel Leite, que neste ato fazia marketing para o início das atividades do primeiro CINE ODEON, que instalara-se naquela casa com sobrado, na Rua João Pessoa, que infelizmente foi demolido este ano por decisão da Sra. prefeita;

... Da cigarreira e confeiteira "A BACURINHA", feita com madeira, pertencente à Olavo de sêo Raposinho, ainda hoje existente, onde se reuniam os que iam assistir ao filme no Cine Odeon, neste tempo já funcionando por trás da casa de Sêo Altino Dias, cujo acesso era feito pela casa do mesmo;
... Dos namoros arrochados na calçada do "Pau do Amor", cuja calçada era alta na parte traseira e na lateral que fica para o lado da Rua São João Batista;

... Dos arrodeios ao redor da Igreja-Matriz, durante a celebração da missa noturna, cujas caminhadas tinham como objetivo único encontrar frente a frente as paqueras que rodavam em sentido contrário, que geralmente terminava em namoro. Em algumas ocasiões, o padre interrompia a missa para chamar a atenção dos rapazes e das moças, alertando-os que a Igreja não era lugar para namoros, terminando por indicar que fossem para o Jardim (Praça);

... Das tertúlias gratuitas no hotel de dona Anália, sob a batuta de Pedro Lopes e sua radiola Phillips, portátil;

...  Das escolas de samba que desfilavam durante o carnaval, no período diurno, e que eram convidadas para adentrar nas residências, onde eram recebidos com ofertas de bebidas e tira-gostos - todos de forma gratuita;

... Das saborosas cocadas de Sêo Antonio de Luzia;

... Dos saborosos pirulitos feitos com açúcar derretido, e que eram vendidos em tabuleiros;

... Dos foguetões soltos por João de Bevenuto, que os acendia sempre com um "pau de lenha" aceso - o conhecido tição;

... Dos balões juninos feitos pelo Sr. Chico Guarda, e por este soltos no patamar, sempre após as novenas. Com eles, os meus sonhos de menino subiam os céus da minha amada terra, desaparecendo na imensidão da noite;

... Dos gritos de Zé Cabral, na agência dos Correios e Telégrafos, passando textos de telegramas via telefone, que funcionava a pilha;

... Da minha primeira professorinha CARMELITA FERREIRA LIMA, filha de sêo Lulu Curinga e dona Mangá.

... Do famoso "Jeep Virado" - que era o cabaré de Chico Silvino (irmão de João Moreira), que funcionava alí naquelas casinhas pequenas de Sêo Chico Tenório, cerca de 10 casinhas distribuídas nos dois lados da estrada de rodagem, sendo cinco de um lado e cinco do outro;

... Do Jeep Ano 1951, pertencente ao Sr. Chichico Torres, o principal veículo de frete em Apodi.

Essa é a minha Apodi (cidade), que sempre evoco-o, descrevo-o, fixo imagens nos antigos casarões senhoriais, nos costumes provincianos e nas fisionomias dos conterrâneos/conterrâneas. Adoro minha terra! Orgulho-me em ser APODIENSE.

Marcos PintoHistoriador e Presidente da Academia Apodiense de Letras.

11 comentários:

Carlos Noronha disse...

Sensacional o texto. Vlw, amigo Marcos. Acrescento as brincadeiras de Faroeste e de Luta de Espadas que nós fazíamos, Imitando os filmes que assistíamos no Cine Odeon e as conversas nas calçadas do Fomento, com "Zé da Carritela", "Raimundo de Águia","Lamundin", Luis Galdino", "Raimundo da Luz", "Durreco", "Mundico", "Tenente do Alho" e o povo todo do beiço dágua, com destaque para a famĺia de Bia e os "Sapo"

Carlos Noronha disse...

Sensacional o texto. Vlw, amigo Marcos. Acrescento as brincadeiras de Faroeste e de Luta de Espadas que nós fazíamos, Imitando os filmes que assistíamos no Cine Odeon e as conversas nas calçadas do Fomento, com "Zé da Carritela", "Raimundo de Águia","Lamundin", Luis Galdino", "Raimundo da Luz", "Durreco", "Mundico", "Tenente do Alho" e o povo todo do beiço dágua, com destaque para a famĺia de Bia e os "Sapo"

entrelinhas disse...

Ai que saudade!!
Eu vivi algumas dessas historinhs tb...por exemplo conheci os balões, que não sei se eram de Chico Guarda, mas, se não me engano, quem soltava-os era João Menino...
Dos foguetões qdo chegvam as procissões...
Não conheci a bacurinha. O q é uma pena...mas sei de algumas historias passadas nessa cigarreira, q era de Papai...um delas é q a minha avó, Don Tilde, catolic apostolic romana, q assisti a tods as missas q fossem celebradaas na paroqui, passava pela cigarreir td dia p pegar a oferta da igreja, e q um dia Papai, negando-se à contribuição, inventou p Vovó q não haveria missa, e q ela indagou a este: Como? se eu ouvi o sino tocar...Ele, astuto e ligeiro, respondeu: não...era os holandeses q vieram comprar o sino q estavam testando...kkkkkkkkkk...Se foi verdade?? kkkkkkkkkkk...quem quiser q conte outra...

Anônimo disse...

Marcos Pinto, parabéns. Você me fez dá alguns passos para trás e reviver tudo aquilo como se fosse hoje. As tomates roubadas, pertenciam ao Seu Joaquim, lembra ? Quero encerrar, pois, tudo que você contou, me comoveu e me derramei em lágrimas.

Anônimo disse...

isso era do tempo do FUMO do velho izauro

Briel disse...

Grande amigo Marcos Pinto, sempre nos contemplando com essas memoráveis histórias de nosso querido Apodi. Tínhamos também os apetitosos "suspiros" de Cotó e os saborosos picolés da sorveteria que havia no Posto Brasília, lembro-me também das figuras de "Milton Cego" que quando estava embriagado não podia ouvir um assobio e o "Mudo Dudé" ou Mudo de Antão que jogava pedras na molecada quando estes imitavam o ato de pintar com as mãos, por isso era também conhecido como mudo pincel.

Raimunda Neide disse...

Lembro também Marcos do elemento conhecido como Madeira,irmão de Dandão de Martinha,que gostava de fazer medo as meninas correndo atrás prá agarrar.Quando dizia assim:lá vem Madeira,o que era de menina corria prá casa com medo.Eu inclusive passei por isso rsrsrs.

Neide disse...

Lembro também dos carnavais no prédio de Chico Paulo que é vizinho a Drogaria de Zé Maria.Nesse tempo durante o dia era oficina e quando chegava a noite a oficina se transformava em clube e ai acontecia o carnaval.Eu ficava só olhando de fora pois ainda era de menor,e naquele tempo criança não podia entrar em festas.Muito diferente de hoje.É por isso que não existe mais inocencia.

Neide disse...

Lembro também dos carnavais no prédio de Chico Paulo que é vizinho a Drogaria de Zé Maria.Nesse tempo durante o dia era oficina e quando chegava a noite a oficina se transformava em clube e ai acontecia o carnaval.Eu ficava só olhando de fora pois ainda era de menor,e naquele tempo criança não podia entrar em festas.Muito diferente de hoje.É por isso que não existe mais inocencia.

Marcos pinto disse...

PARABÉNS Amigo Valdir, pela sua vasta memória fotográfica quanto ao perfil do mudo DUDÉ, irmão de Antão Moreira, cuja faceta que o irritava não conseguí me lembrar,que era o de imitar o passar de um pincel, daí o apelido de MUDO PINCEL. Obrigado por conduzir-me a esse replay do tempo que nos enleva e nos transporta a um contagiante e nostálgico passado.

entrelinhas disse...

Ai eu lembro de Dudé...morava com Seu Raimundo Monteiro, lembro do doce de leite e dos suspiros de Cotó, dos bolinhos de boré...q infancia feliz foi a minha...