quinta-feira, 17 de novembro de 2011

[espaço do leitor] Tipos populares apodienses - Edite Pêi-pôu

Já dizia o saudoso Mestre CÂMARA CASCUDO que toda cidadezinha que se preza tem seus tipos populares, quebrando a rotina das imagens cotidianas. Uns são loucos, outros são pinguços contadores de anedotas e estórias, outros tantos são apenas seres maltrapilhos que entregaram suas sinas de vida a percorrer as ruas à esmo, sem destino certo. A nossa perfilada EDITE PÊI-PÔU era uma "doida varrida" que varava as noites escuras das ruas da pacata cidadezinha, com o bestunto (juízo) atacado pela famosa "força da lua". Era componente das tradicionais famílias FERREIRA LEITE e NORONHA do município de Apodi. Nasceu a 28 de Agosto de 1913, filha legítima do Sr. Frutuoso Américo de Noronha e Maria dos Anjos Ferreira Leite. Edite era prima de Tião Pinto, pai de Klinger Pinto. Durante as décadas de 1960 e 1970 era figura conhecidíssima na veneranda cidade do Apodi. Seu nome civil era EDITE LEITE DE NORONHA.

Solteirona  pelo  fato  de  ser  mentecapta, ficava  tiririca  quando  lhe  apelidavam  de  EDITE  PÊI-PÔU, ocasião  em  que os  achincalhes  da  meninada  e  dos  pinguços  e  desocupados   despertava-lhe  tamanha  ira, seguida  de  um  corolário  de  nomes  feios, de  fazer  corar  o  mais  empedernido  dos moralistas.  O  apelido  a   perturbava  profundamente  porque  a  fazia  relembrar  um  incidente  ocorrido  altas  horas  da  noite, por volta do ano de 1955,  entre  ela  e  o  motorista  do  caminhão  do  Coronel  Lucas  Pinto  -  o  Sr. ABEL  MEDEIROS, conhecido  popularmente  como  "ABEL  PÉ-DE-QUENGA", apelido  este  em  alusão  à  um  defeito  físico  que  o  mesmo  tinha  no  pé  direito.  Abel  era  casado  com  Vicência,  irmã  de  Belchior  Dantas.  Pois bem,  à  época  deste  ocorrido  o  sistema  de iluminação  pública  da  cidade  era  gerado  na  Usina  Elétrica  pertencente  à  Prefeitura  Municipal, ou seja, ao  município,      sendo  certo  que  a  iluminação  pública  e  domiciliar  era  interrompida  às  dez  horas  da  noite. Quando  faltava  15  minutos  para  as  dez  horas, o  assistente  da  Usina  de  força  e luz  dava  um  sinal  característico  apagando  as  luzes  e  ligando  imediatamente, numa espécie  de  pisca-pisca, ocasião  em que  as moças  que se  encontravam  ao redor da  Igreja-Matriz  e  do  Jardim  empreendiam  correria  em  direção  às  suas  casas, cumprindo  à  risca  as  advertências  feitas  pelos  pais  quanto  ao  recolhimento  ao  lar.

O  eficiente  motorista  ABEL  tinha  chegado  de  viagem  por  volta  das  09 horas  da  noite,  e  como  de  costume, após  o  jantar,  sentara-se  sobre  sua  calçada  em  aconchegante  cadeira  conhecida  como  "espreguiçadeira".  Após  o  apagar  da  iluminação pública, continuou, mesmo  sob  escuridão  quase  total, sentado  na  calçada, contando  fatos  ocorridos  durante  sua  viagem  rumo  à  cidade  de  Fortaleza.  Tinha  o   costume  trazer  o  seu  revólver  preso  à  cintura.  Por  volta  das  onze  horas  da noite, eis  que  o  Abel viu  um  vulto  caminhando  em  sua  direção, ocasião  em  que  o  mesmo  ficou  em  estado  de  alerta.  Receando  tratar-se  de  alguém  com  intenções  diabólicas, já  que  deixara  alguns  desafetos  no  seu  estado  da  Paraíba, perguntou  três  vezes  quem  era  que se  aproximava, tendo  o  silêncio  como  resposta  e  a  continuidade da  aproximação.  Temendo  uma  iminente  ofensa  à  sua  integridade  física, sacou  do  revólver  e  disparou  um  tiro  em  direção  ao  solo, tendo  a  bala  ricocheteado  em  um  dos  tijolos  bem  cozidos  e  resistentes  dos  que  compunham  a  calçada, indo  atingir  a  doida  EDITE  na  altura  do  baixo  ventre.  Quando  a  doida  foi  atingida, deu  um  grito, dizendo:  "Abel, você   me  matou!.  Verificado  o  triste  incidente, o  Abel  foi até  a  residência  do  Coronel  Lucas  Pinto  onde  pegou  o  caminhão  e  conduziu  Edite  imediatamente  para  Mossoró, onde  a  mesma  foi  cirurgiada, tendo  sido  recuperado  em poucos  dias, dado  o  ferimento  não  ter  sido  de  natureza  grave.

Mais  ou  menos  por  volta  do  ano  de  1976  Edite  Pêi-Pôu  passou  a  residir  em  Mossoró,  no  "ABRIGO  AMANTINO  CÂMARA", pertencente  à  paróquia  de  São  José,  destinado  a  acolher  idosos  em  situação  de  abandono  familiar. Faleceu  por  volta  do  ano  de  1986  neste  acolhedor  abrigo, completamente  ignorada  pelos  seus  familiares.  Foi  na  verdade  uma "canoa  doida", levada  aos  trambolhos  pelo  rio  da  vida.  Figura  curiosíssima  do  passado  do  Apodi.  Ainda  hoje  ecoa  nos  confins  da  minha  memória  a  sua  incontida  ira, respondendo  à  pergunta  dos  "acanalhados"  do  meu  tempo:  EDITE,  CADÊ  ABEL?

Tá no rabo da mãe seu filho duma puta!

Alguns circunstantes ainda insistiam no achincalhe, gritando bem alto: PÊI-PÔU! Ao que ela continuava no cavaquismo: Pêi-Pôu é a b....... da sua  mãe, Sêo fresco!

Páginas escritas com as tintas da saudade e à luz da memorização de fatos e personagensque de alguma forma marcaram meusnostálgicos anos na minha amada e sempre querida terrinha. Meu berço de nascimento e de enlevo de rapazote até os 15 anos de idade, quando fui estudar em Mossoró, posto que ainda não existia o segundo grau em Apodi.

Marcos Pinto – Historiador e Presidente da Academia Apodiense de Letras.

2 comentários:

Anônimo disse...

Alguém poderia me dizer o que faz a Academia Apodiense de Letras? Vejo muito retalho nesse blog, mas ninguém diz o que essa instituição é de fato.
alguém...

Anônimo disse...

janio hoje temos o famoso "goma" quer saber como ele fica chame ele por este nome. kkkkkk um abraço.