Em constante atrito com o
governo federal por causa da falta de recursos, as prefeituras viram aumentar
nos últimos anos as dificuldades para concluir obras iniciadas com recursos
federais, por meio de convênios diretos e emendas de parlamentares. Na maioria
das vezes, os recursos das emendas são apenas empenhados (promessa de pagamento
futuro), mas a liberação muitas vezes não ocorre ou é jogada para os anos
seguintes, entrando no buraco negro dos chamados restos a pagar (pagamentos
adiados de um ano para outro), já batizado pelos políticos de “orçamento
paralelo”.
Segundo levantamento da
Confederação Nacional dos Municípios (CNM), do estoque de R$ 25,5 bilhões de
restos a pagar inscritos em 2013 — relativos a recursos destinados a
prefeituras —, apenas R$ 4,1 bilhões, ou 16,2%, foram efetivamente pagos este
ano.
O estoque de R$ 25,5 bilhões
inclui restos a pagar desde 2002 e que vão passando de um Orçamento anual para
outro. O volume maior, no entanto, é mesmo de 2012, quando foram inscritos no
Orçamento daquele ano um total de R$ 12,5 bilhões, ou seja, quase metade do
estoque.
Do total de R$ 25,5 bilhões,
R$ 2,7 bilhões são restos a pagar processados (empenhados e liquidados, mas não
pagos no ano) e R$ 22,9 bilhões são não processados (empenhados, mas com o
pagamento transferido para o ano seguinte). Os R$ 2,7 bilhões são referentes a
obras já concluídas, e esses recursos deveriam ser distribuídos entre 7.975
empenhos.
2 comentários:
Por que os pais terem de pagar com dinheiro de salário para que seus filhos,crianças do Brasil, tenham de estudar?
Quem tem alguma vivência da política, como é praticada nas pequenas e médias comunidades do interior de São Paulo (nos outros Estados não deve ser diferente), sabe que um dos mais graves equívocos políticos recentes foi a instituição da reeleição nos municípios, uma vez que nesse nível o controle social é, paradoxalmente, muito difícil.
Oito anos ininterruptos são em geral suficientes para organizar e estratificar um mecanismo de corrupção local que tende a se autoperpetuar.
No primeiro “round” elege-se o prefeito e -com ele-, no segundo, elegem-se vereadores seus “velhos” secretários. Estes logo voltam à administração, deixando na Câmara seus suplentes, que passam a obedecer ao Executivo.
Neutraliza-se, assim, o poder fiscalizador do Legislativo.
Graças à “acumulação” de recursos feita com tranqüilidade pela ausência do controle legislativo, o poder incumbente acaba controlando também a imprensa (escrita, radiofônica e televisiva) local, eliminando o pequeno controle social que restava.
O processo reforça-se a cada nova eleição, a não ser em casos catastróficos: ou de rapinagem tão extravagante que chama a atenção do Ministério Público ou de alguém da “família” que, inconformado com a distribuição dos “lucros”, resolve abandonar a lei do silêncio…
Em 2003 a Controladoria Geral da União (CGU) iniciou um interessante programa de controle de gastos, selecionando ao acaso alguns municípios e submetendo suas contas a auditoria com relação ao uso dos fundos federais que receberam.
No último número do “Quarterly Journal of Economics” (May 2008: 703-745), dois economistas, Cláudio Ferraz (do Ipea) e Frederico Finan (da Universidade da Califórnia) publicaram um artigo sofisticado e interessantíssimo, com o título “Expondo Políticos Corruptos: o Efeito da Publicidade das Auditorias no Resultado Eleitoral”.
Suas conclusões: 1) a publicidade de procedimentos corruptos reduz muito pouco a probabilidade de reeleição mesmo quando há reincidência, o que não deixa de ser decepcionante; e 2) a penalização do incumbente é maior nas comunidades onde a mídia é mais agressiva e menos indulgente.
O artigo mostra, por outro lado, o papel fundamental da mídia local (não controlada pelo poder incumbente) como fator do eventual sucesso da oposição. A divulgação pela mídia local da corrupção tende a melhorar (ainda que lentamente, como mostra o trabalho) a qualidade dos administradores.
O grande problema, entretanto, é que é a própria reeleição que produz a “miopia” da mídia local…
Antônio Delfim Netto é economista, professor, ex-deputado federal e ex-ministro da República
* Texto originalmente publicado no Folha de São Paulo, dia 9 de julho de 2008. Continua atualíssimo.
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